O Futuro Presente – Chico Futuro

O Futuro Presente

Chico Futuro

O futuro

 

O adolescente Chico Futuro é destes caras super antenados em vida saudável.
Geração saúde, é o que todos dizem dele e sua tribo, todos adolescentes na faixa dos vinte anos.

Peraí, adolescente com 20 anos? Isto mesmo. Se considerarmos que ele e seus coleguinhas viverão 90 anos, então a adolescência poderia ir até quase os trinta.

E é isto que está efetivamente acontecendo, com a turma demorando mais a deixar a casa paterna e cair na vida. Não só na idade, mas no comportamento, são adolescentes.

A grande questão hoje é: até quando está indo a adolescência? Certamente não termina mais aos 18 anos, mas talvez até aos 30 mesmo. Isto passando do pediatra para o hebeatra, que é o médico dos jovens, lembrando-se que hebe é a deusa grega da juventude (apesar de no Brasil Hebe não lembrar tanta juventude assim).

O engraçado disto tudo é que muita gente fica com o pediatra ou hebeatra até os 30, e a partir daí já quer marcar consulta com um geriatra, dos tais especialistas em “antienvelhecimento”, “antiaging” ou coisa que o valha. Então a sequência agora ficou: pediatra > hebeatra > geriatra.

Chico trocava ideias sobre saúde em todos os sites de relacionamento que participava. Tinha grupos de discussão sobre o que cada um fazia pra se tornar parte de uma “geração saúde”, cada dia aparecendo um colega com uma novidade mais mirabolante, uma receita esdrúxula qualquer, dietas mil, fórmulas antienvelhecimento, etc e etc. Sabia puxar nos sites de busca os principais assuntos sobre vida saudável e conhecia os nomes dos grandes especialistas sérios e confiáveis e também de outros nem tão sérios e nem tão confiáveis assim.​

As dietas da moda eram as mais variadas e mirabolantes possíveis, sendo a sua “vida média” no máximo uns 6 meses. Ou seja, duas vezes por anos pelo menos aparecia uma novo modismo dietético, sem ter havido qualquer tempo de  ter estudos sérios e controlados sobre sua eficácia e segurança . Todas prometendo tudo, e especialmente perder peso. Vale aquela última que os artistas e influencers estão fazendo.

A única encrenca mais séria que o Chico teve até agora foram uns ataques de pânico, que logo cediam com umas gotinhas de Rivotril. Além de ser um pouco gordinho…

E lá vai o Chico para a primeira visita ao cardiologista, com seu carrinho elétrico ecologicamente correto, que não faz barulho e nem solta fumaça, mas anda bem devagarinho e mais parece um eletrodoméstico do que um carro. Estaciona numa vaga que tem um parquímetro junto com uma tomada. Puxa um fio do carro, pluga na tomada, entra com seu cartão de débito no slot e digita no visor, junto com sua senha: duas horas de estacionamento e de recarregamento das baterias.

Seu carro era todo certificado por ONGs e empresas ambientais que o atestavam com nomes como “sustentável”, “ecologicamente correto”, “amigo do planeta” e outras arengas do tipo.

Vai ao cardiologista? Sim. Ele já pertence à geração-prevenção. Tem consciência de que a cada década que passa aparece gente mais nova com infarto e similares.

Então, se fizermos as contas ele aos 20 já está até meio atrasado.

Ainda bem que não tem histórico familiar para doença cardíaca ou colesterol alto, se não teria que começar a pensar em prevenção aos 10 anos. Se considerarmos que na atualidade já tem gente tendo infarto lá pelos trinta e tantos anos, e que as placas de gordura (os ateromas) que levam às obstruções demoram de 10 a 20 anos pra se formar, podemos concluir que elas tiveram seu início lá na infância ou adolescência.

O conceito atual é:  a prevenção mais precoce e eficaz do infarto é um problema pediátrico/hebeátrico. Se uma placa de gordura nas artérias leva uma a duas décadas pra se formar, em média, o Chico tem que começar a cuidar aos vinte pra não ter um infarto aos quarenta.

Mesmo que o exame mostre que está tudo bem com ele, a ideia será ficar “fichado” com um cardiologista, para no máximo daqui a cinco anos fazer nova avaliação e ir comparando ele com ele mesmo ao longo da vida.

Se der colesterol alto, e este não se reduzir com dieta adequada, ele já vai começar a tomar a sua estatina, ou outro remédio desses novos e potentes que tem surgido.

Nesse caso voltará para controle duas vezes por ano, indefinidamente.

Ele já sabe que do colesterol dosado no sangue, no máximo 20% vem da alimentação. Os outros 80% vem da própria fabricação pelo organismo, especialmente pelo fígado, que é onde agem as estatinas.

Então uma dieta bem caprichada conseguiria teoricamente baixar em no máximo 20% o colesterol (em teoria, pois nem isso é possível, já que ninguém consegue comer com zero de colesterol e gordura saturada).

Um cuidado especial terá de ser tomado com as gorduras trans (um tipo de gordura hidrogenada) que não existe na natureza e que é um produto puramente industrial, fabricado. Como o nosso corpo nunca tinha visto desta gordura, não sabe o que fazer com ela. Então ela se acumula mais, e ainda por cima faz o pior das duas coisas: aumenta o LDL vilão e ao mesmo tempo abaixa o HDL herói.

O cúmulo da vilanice! Pior do que a gordura animal, o torresmo, que “só” aumenta o LDL sem abaixar o HDL.​ Então, olho nos rótulos, que agora são obrigados a constar quanto de gordura trans o alimento embalado contém.

Qual o limite ideal? Quanto menos, melhor, mas nunca passar de 2 gramas de gordura trans por dia.
“Um tanto obeso e até meio leso da vida urbana sou mais uma vítima.
Bem representado eu pareço um fardo todo engravatado, uma besta legítima.
A minha mulher não sabe o que quer, tem sarapater na massa encefálica.
Vive inquieta fazendo dieta pois a sua meta é fica esquálida.”
Trecho da moda-de-viola “Caipira de Gravata”,
de Zé Mulato

 

Os versos singelos dessa música  sertaneja acima são de  um grande filósofo caipira que clareia de forma cruel as contradições e imposições da vida urbana.
Falam de um sujeito que, vindo do ambiente rural e ainda bastante desajeitado, tenta se adaptar e sofre as mudanças do novo estilo de vida. Se torna cada vez mais balofo, lutando pra caber dentro de um terno que quando foi comprado até que servia bem.

E da sua mulher, se submetendo de forma insana à ditadura da magreza.

O nosso Chico Futuro, apesar de buscar hábitos saudáveis, tem um problema.
É meio rechonchudinho, aliás uma marca registrada de toda a sua geração.
E olha que é o menos cheinho da sua tribo. Vive em dieta, mas o seu IMC (1) fica teimosamente perto dos 30.​

(1)  IMC: índice de massa corpórea, que é obtido dividindo-se o peso (em kg) pelo quadrado da altura (em metros). Seus limites seriam um mínimo de 18,5 e um máximo de 25; talvez até 27 para aqueles mais musculosos ou com um porte troncudo, do tipo  “chassi reforçado”.

Também pudera, com as porções gigantes que servem!

 

 

As Super Porções

​No começo (1916) eram as garrafinhas de Coca-Cola, na embalagem de 185 ml, meio retas, sem cintura, as únicas que então existiam.

Depois a mais famosa de todas, a garrafinha de vidro “cintura fina” de 237 ml.
Nos anos 1960 veio a garrafa média, mais comprida, de 290 ml. ​Logo depois, foi lançada a garrafa não mais individual, mas para todo o grupo familiar. Era a Coca-Cola tamanho Família (760 ml). A propaganda dizia “ rende quatro copos ou mais” indicando que todos em casa seriam servidos.

Depois vieram a de 1,25 litros e a Big Coke de 2 litros.

Em 1999 foi lançada a garrafa de 2,5 litros, ironicamente com o slogan “Curta” (?).

E finalmente (será que finalmente mesmo?) pelo menos até agora, a obscena garrafa (ou seria tambor?) de 3 litros.

Ora se no começo a Coca que dava pra toda a família era de 760 ml, e agora já é a de 3 litros, e o número de componentes das famílias não aumentou na mesma proporção, só há uma explicação: para uma família de 4 pessoas, uma dose que antigamente se propunha como a quarta parte de 760 ml (190 ml) passou agora para a quarta parte de 3 litros , ou seja 750 ml, que é quase o tamanho da antiga Coca Família!

Já é comum ver em pontos de vendas nos cinemas “estilo americano” a porção individual de refrigerante num vistoso copo de um litro!​

E para acompanhar: um balde (isto mesmo, que outro nome se daria?) de pipocas.
Não é á toa que as salas de exibição faturam mais com a venda de pipocas e refrigerantes do que dos bilhetes para o cinema.

E o que dizer do hambúrguer monstro recém lançado por uma lanchonete nos EUA?
Você ingere a bagatela de 5 000 calorias, 300 gramas de gordura, 744 mg de colesterol (mais que o dobro da cota diária total) e 10.000 mg de sódio  que correspondem a 25,0 g de sal (sendo o máximo saudável 2.000 mg de sódio, o que corresponde a 5,0 g de sal)

.

E o cliente que comê-lo todo, sem deixar nada de resto, ainda ganha uma camiseta (imagine-se de que tamanho será a tal camiseta?).

Hoje já existem porções que são de 300% até 700% maiores do que as porções dos mesmos alimentos de apenas 20 anos atrás!

Ora, o dispêndio calórico não subiu nada neste período, e com certeza o sedentarismo aumentou.

Pra onde então vai toda esta comida em excesso?

​Não se falou tanto do “american way of life” (*) invejado pelo resto do mundo?

Pois agora o mundo todo está importando o “american way of dying” (**)

(*) american way of life – modo de vida americano.

(**) american way of dying – modo de morte americano. 

E lá vai o nosso Chico Futuro dirigindo seu carrinho elétrico cheio de recomendações para o tratamento não farmacológico de sua obesidade e pré diabete detectada nos exames. Fará dieta com menos “fast foods” ,  refrigerantes e similares,  além de exercícios moderados e regulares durante 3 a 6 meses. Se responder bem deverá manter essas mudanças saudáveis como um compromisso por toda a vida.

Se não conseguir ou essas medidas não funcionarem, será tentado o plano B: modernos medicamentos injetáveis e orais já estão sendo usados, alguns para tratar a pré diabete ( e prevenir que evolua para franca diabete)  e outros   para emagrecer. Os nomes são mais uma sopa de letrinhas: inibidores da SGLT2 e análogos ou agonistas da GLP1.

Trocando em miúdos:

SGLT2 . A primeira dessas substancias foi isolada da casca da raiz de uma macieira em 1835. Daí demorou mais de 150 anos até os SGLT2 passarem a ser investigados em estudos clínicos para diabete. Aqui temos a dapaglifozina e a empaglifozina, ambos comprimidos para se tomar uma vez por dia. Eles tem a vantagem adicional de agirem favoravelmente no coração (melhoram a insuficiência cardíaca) e nos rins (melhoram a disfunção renal).

 

GLP1: O primeiro medicamento dessa classe foi descoberto na saliva do monstro de Gila, um lagarto dos desertos americanos e mexicanos. Apesar do nome, não passa de 36 cm; talvez a alcunha“monstro” seja mais pela feiúra, e também por ser venenoso. A substância feita a partir da saliva do lagarto é a exenatida. Depois surgiram outros agonistas da GLP1 como a liraglutida (injeção diária, nomes comerciais Saxenda e Victoza) e a semaglutida (injeção semanal, Ozempic e Wegovy) e agora também oral, um comprimido por dia (Rybelsus). Um pouco mais elaborada é a  tirzepatida (injeção semanal, Mounjaro e Zepbound) que além de estimular o GLP1 ainda age num outro parente dele, o GIP, com função semelhante. Portanto, mais reforçado e com um efeito maior no emagrecimento, além do seu efeito original de antidiabético.

 

Opa! Olhaí! De novo a Natureza dando  dicas para novos medicamentos !

O Dr CLIN reina absoluto – O vovô Sam

Surge o Dr. CIR – José Brasil

Agora, a vez do Dr. CAT – João Moderno

O retorno em grande estilo do Dr. CLIN – Bete Trintona

O Futuro Presente – Chico Futuro